Noventa e três seiscentos e sete, noventa e nove zero zero
um, segunda volta, homi, tudo farinha do mesmo saco, de um lado Zé Lesadin, do
outro Juca Bestin, vote não, meu camarada, se foder eles todin, só querem é se
dar bem, chega na prefeitura esquece de nóis, pfffff, arrisco uma argola entre
uma baforada de cigarro, não falo, seria tolice falar, tolo é que fala sozinho,
e a tolice é tanto maior quanto o fato de eu não ser nem eleitor, estrangeiro tem
suas vantagens, poucas, claro, ser estrangeiro não me permitiu poupar meus
ouvidos dessa chafurdice sonora mal amplificada, NO-VEN-TA E TRÊS SEIS-CEN-TOS
E SE-TE, NO-VEN-TA E NO-VE ZE-RO ZE-RO UM, é ele o melhor pra Cafundó de Cima!,
Zé Lesadin é ficha limpa!, Porra!, Puta que pariu!, se tem coisa nesse mundo
que tem me agoniado, você nem imagina, é essa porra de não mandar sequer no que
embioca nos meus ouvidos, sim, é demais, é um estupro auditivo de uns quinze em
quinze minutos, é o brega, é o funk, zorra, rafinha, casseta, a voz do vizinho,
o latido do cachorro, o miado do gato no cio, o pum, o pá, o tchererê, o
tchibum, Puta que pariu!, quero uns fones!, dos bons, hein!, que eu não consiga ouvir sequer o fim do mundo, o cara vem, eu pensando
isso, me entrega o santinho, “pense bem, vote tre-ze, é o melhor”, ainda me sai
um sorriso, aquele de “ok, ok, tomara os maias estejam certos”, estão nada,
né?, eu sei, mas esperança boba, o mundo podia acabar pra uns quantos que
enchem meu saco, “olhe, a palavra de Deus pra você refletir”, aceito, como eu
sou simpático!, pego a cadeira, fujo da calçada, sei lá, pode vir aquele neguim
que anda aí vendendo bala ou a mulé da internet da claro ou a moça das sopas de
letras ou o cabra da canjica ou o carro do bolo ou o fulano do "sorvete de dois
por um real" ou a mulher da tapioca ou o homi da ginga, entro, afe!, deito na
cama, sem mais nem menos, você não vai acreditar, vem o coelhinho da Páscoa,
sobe a cama de um pulo, me olha sério, sério, “Pô, Ricardo, você não vai votar
em mim? Vota, cara, por favor, ninguém acredita em mim, porra!, eu sou um
coelhinho bom!, olha pra mim!, olha pra mim!, eu não pareço bonzinho?”, me
levanto, pego a vassoura, “vai a bem ou a mal?”, ele fecha a cara, se encaminha
pra porta e na saída ainda diz: “depois não diga que fui eu que acabei com a
sua Páscoa”, eu rio, quando a coisa passa é assim, dá riso mesmo, volto a
deitar, ligo a televisão, NO-VEN-TA E NO-VE ZE-RO ZE-RO UM, É NE-LE QUE DE-VE
VO-TAR!, graças a Deus não tenho um revólver!
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